Alunos Sem Limites

 




A indisciplina em ambiente escolar já não é só um problema das escolas. É também um problema social. Estamos em crise e, por esse motivo, necessitamos agir. É crucial que haja uma intervenção imediata e assertiva. Portugal não pode continuar a fechar os olhos para uma crescente indisciplina que tem corroído o sistema educativo público e com isso comprometendo o futuro das próximas gerações.

Posso descrever uma aula típica numa qualquer escola secundária portuguesa. Um professor que tenta explicar um conceito de matemática com alguma complexidade, mas não consegue fazê-lo porque é constantemente interrompido por conversas paralelas, telemóveis a tocar e alunos que entram atrasados. Tudo isto, mesmo depois de chamados à atenção pelo professor. Um enorme sinal de desrespeito para com o professor. Aquele que deveria ser a autoridade, quando solicita silêncio ainda recebe provocações. Estas situações são recorrentes nas escolas por esse país fora, estes casos de agressão verbal, tanto dentro como fora do ambiente escolar, tornaram-se demasiado frequentes, ultrapassando os limites da instituição educativa e invadindo a vida pessoal dos docentes. Os professores são desrespeitados, agredidos verbalmente e, muitas vezes intimidados por alunos. Se isto não bastasse temos este fenómeno a ser associado também a país irresponsáveis que agem contra os professores.

Por tudo isto, já não é possível ignorar um quadro que é cada vez mais preocupante, nem assistir de braços cruzados a uma normalização de comportamentos inaceitáveis.

Não podemos continuar a dizer, como era habitual nos governos de Costa, que são casos isolados. Não são! São antes um sintoma de uma doença social mais profunda: a ausência de limites e de responsabilização.

Se não sabemos ao certo por onde começar, podemos fazê-lo seguindo o exemplo da Itália que na recente legislação sobre o assunto mostrou saber como enfrentar esta realidade. No início deste ano letivo, estabeleceu que o comportamento dos alunos seria tido em conta na progressão escolar. Este foi um sinal de que a Itália compreendeu, e sobretudo explicou, que a educação vai muito além dos conhecimentos académicos.

Podemos considerar um ato de coragem esta legislação que aborda diretamente o problema sem rodeios e desculpas esfarrapadas. Com esta nova lei, em Itália, um aluno que sistemicamente perturba as aulas, desrespeita professores ou tem comportamentos inadequados pode ser reprovado, independentemente das suas notas.

Esta nova reforma italiana introduziu medidas concretas que merecem a nossa atenção. Os alunos têm de ser avaliados, quanto à sua conduta, de zero a dez. Os que tiverem, por exemplo, um seis em conduta terão que apresentar um trabalho final escrito sobre cidadania, que também este será avaliado. Segundo essa mesma lei, os alunos que obtenham uma nota igual ou inferior a 5 em conduta, serão reprovados no ano letivo, independentemente do seu desempenho académico. Além da reprovação por mau comportamento, foram também introduzidas multas de 500 a 10 mil euros para casos de agressão ou violência contra o pessoal escolar. Exemplar.

Estas medidas, mesmo que lhe possam parecer radicais, surgem em resposta ao crescente número de incidentes violentos contra professores e assistentes operacionais em Itália.

É importante referir que esta solução para a indisciplina escolar não atua apenas nas medidas punitivas, mas também numa estratégia abrangente que envolve vários atores, nomeadamente os pais e encarregados de educação o. Os pais têm de deixar de ser meros espetadores, desresponsabilizando-se do seu papel, apresentando-se apenas para pedir justificações e pôr em causa a escola quando esta obriga a que se cumpram com as regras. Nesse sentido, quando um aluno persistentemente demonstra comportamentos inadequados, os encarregados de educação/pais são chamados a participar ativamente.

Essa participação pode passar por sessões de aconselhamento parental, onde é possível compreender a razão pela qual o filho mantém determinados comportamentos e em conjunto com a escola encontrar estratégias que promovam a mudança comportamental.

Por cá para além das suspensões, que são sempre muito mal-aceites pelos encarregados de educação, pouco há para agir. Até a presença policial nas escolas é vista como uma ameaça, em vez de como um garante de segurança.

Precisamos de compreender que uma escola que chama a polícia não é necessariamente mais indisciplinada que a outra que opta por não chamar. É, na verdade, uma escola que pretende ser segura e por isso é atuante, não manda para debaixo do tapete os casos de indisciplina que ultrapassam o âmbito escolar. Quer resolvê-los e pede ajuda para o conseguir.

Por cá, as consequências para comportamentos graves devem ser claras, incluir multas para as famílias, suspensões acompanhadas de programas de ressocialização e, em casos extremos, retenção de ano letivo, mesmo que com transferência imposta. A lei italiana não hesita em estabelecer consequências severas. Em Portugal, precisamos de medidas igualmente firmes, responsabilização dos pais e suporte legislativo. Qualquer solução deve ser mais do que apenas uma punição. É importante garantir que esses alunos sejam ajudados a mudar o comportamento através de programas de educação cívica, resolução de conflitos e desenvolvimento de competências socioemocionais.

Alunos com histórico de indisciplina, para além das punições previstas, devem ser envolvidos neste tipo de programas.

A mudança que Portugal precisa não é instantânea. Exige um compromisso de governo, autarquias, família e professores. Garantidamente o custo de não agir em concordância com o cenário reconhecidamente complexo, será imensurável para as novas gerações de jovens, que ficarão sem ferramentas para a cidadania, e para o sistema educativo público que poderá colapsar devido ao progressivo desmantelamento dos valores fundamentais que sustentam a nossa sociedade, que estes comportamentos incutem.

A hora de agir é agora! É altura de restaurar a dignidade da profissão de professor, da escola pública, não com violência, não com autoritarismo, mas sim com regras claras, método e uma visão clara de que escola queremos para o futuro.

A indisciplina escolar não é apenas um desafio das escolas, mas sim um desafio social cujo combate deve ser visto como um investimento no futuro coletivo de Portugal.

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